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Ao Soberno E Sempre Augusto Monarcha El Rey Dom João Quinto de Portugal [reprodução fotográfica de gravura de Guillaume Debrie, c. 1748]

Mário Novais (1899-1967)

[1947]

MC.FOT.0652

Numa das raras vistas do interior do Palácio Real da Ribeira de Lisboa, o rei D. João V protagoniza uma simbólica cerimónia de Lava-Pés aos pobres da cidade. 

O episódio é conhecido graças a uma gravura datada de c. 1748 e realizada pelo artista de origem holandesa Guillaume François Debrie (ativo em Portugal entre 1728 e 1755). A cena foi desenhada, passada a gravura e oferecida ao Soberno e sempre Augusto Monarcha el Rey dom João quinto de Portugal, pelo seu mais humilde e fiel criado Guilherme Francis.co Lourenço Debrie, acompanhada de legenda laudatória à natureza magnânima do rei.

É possível que a cena tenha decorrido na Sala dos Tudescos, onde se exibia a esplêndida coleção de tapeçarias da casa real, perdida no terramoto de 1755. Era o principal espaço de aparato do palácio desde os tempos de D. Manuel I e a maior sala do conjunto palatino, com uma área superior a 450 m2. Era ainda o local onde se realizavam os atos solenes das Cortes, o que lhe conferia particular simbolismo político.
 
Neste cenário tão reservado, luxuoso e emblemático, o monarca enverga vestes sacerdotais e encontra-se ajoelhado, diante de um grupo de treze pessoas pobres que, por uma vez, cruzaram as portas do Terreiro do Paço e acederam à residência real. Opera-se, assim, uma curiosa inversão dos papéis sociais: é o rei que, despojado da sua dignidade majestática, trata das pessoas mais frágeis da sociedade que lidera. É um homem profundamente doente, num arrastado final de vida depois de um violento ataque sofrido em 1740, que lhe deixou parte do corpo paralisado. Tal como Jesus, humildemente, lavou os pés aos apóstolos durante a Última Ceia (ato que antecede a Paixão de Cristo), também o rei cuida dos seus súbditos antes de passar da existência terrena à vida celeste.

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© Museu de Lisboa